Porque é que quanto mais se gosta mais difícil é demonstrar que se gosta? Acarinhar passa a ser constrangedor enquanto que, a um mero conhecido, mais facilmente tocamos, abraçamos, dizemos coisas bonitas.
Quando é que a proximidade nos começou a afastar? Quando é que a vergonha se apoderou das nossas mãos, impedindo o avanço? Quando é que a vergonha se apoderou das nossas bocas e das nossas gargantas e das nossas vozes e nos impediu de dizer?
Em que ponto estávamos quando a vergonha não existia e em que ponto ficámos quando ela decidiu aparecer? A que ponto devemos voltar para que o gesto e a voz voltem a ganhar vida própria?
É curioso. Para largar palavras afiadas, exageradas e generalizadas a vergonha nunca aparece.
Para que serve a vergonha afinal?
Para nos amordaçar e impedir de sermos quem somos? Para nos impedir de fazermos o que queremos? De sermos genuínos? De dizermos o que pensamos?
Para nos deixar presos num chão que não é o nosso? Ou para nos relembrar de que somos frágeis e nos devemos manter conscientes da nossa insignificância?